segunda-feira, fevereiro 07, 2005

Pré-socráticos (Parte II)


PRÉ-SOCRÁTICOS – PARTE II

O Nascimento da epopéia (*)

(*) Séculos a fio, a juventude grega cresceu recitando os poemas homéricos e admirando os seus heróis. A Ilíada narra em forma poética o último ano da Guerra de Tróia, ocorrida séculos antes da época de Homero, durante o período micênico. Logo na abertura do poema, Homero apresenta o seu tema:

“Conta-me, ó deusa, do Peleio Aquiles
A ira tenaz, que, lutuosa aos gregos,
Verdes no Orço lançou mil fortes almas,
Corpos de heróis a cães e abutres pasto:
Lei foi de Jove, em rixa ao discordarem
O de homens chefe e o Mírmidon divino.”

Na seqüência da narrativa revela-se o motivo dessa cólera. Ao despojar “o rápido e excelente” Aquiles do seu justo prêmio (a jovem prisioneira Briseida), o rei Agamêmnon ofendeu seriamente a honra de Aquiles e violou o preceito solene que os heróis de guerra deviam tratar-se com respeito. Aquiles, com orgulho ferido por essa ofensa à sua honra, recusa-se a lutar ao lado de Agamêmnon na batalha contra Tróia. Aquiles intenta preservar sua honra demonstrando que os aqueus (como chama Homero esses gregos micênicos – “atenção: assim como os dórios os micênicos são gregos”) não podem prescindir do seu valor e da sua bravura militar. Somente quando muitos bravos homens foram assassinados, entre eles o seu dileto amigo Pátroclo, Aquiles deixou de lado a sua rixa com Agamêmnon e entrou no combate.

Homero utiliza um acontecimento “particular”, a disputa entre um Agamêmnon arrogante e um Aquiles vingativo, para demonstrar uma lei “universal” que a “perversa arrogância” e a “ruinosa cólera” serão causa de muito sofrimento e morte. Homero demonstra que há uma lógica interna na existência humana, uma ordem significativa por trás dos negócios humanos. Para Homero, afirma o classicista britânico H.D.F. Kitto, “a toda ação corresponde uma conseqüência; uma ação mal avaliada acarreta maus resultados”. As ações das pessoas obedecem a certo padrão fixo; os seus feitos estão subordinados aos desígnios do destino ou da necessidade. Aqui faço um paralelo, talvez equivocado, com a ação dos bombeiros que trabalharam no 11 de Setembro, que mesmo certos de que iriam encontrar pela sua frente a morte, não se desertaram e seguiram o curso do correto. Com a visão de um poeta Homero compreendeu aquilo que se tornaria uma atitude fundamental da mente grega: a existência de uma ordem das coisas universal. Os gregos mais tarde a formulariam em termos filosóficos.

Além disso, Homero retrata o valor humano. Embora a vida humana seja governada pelas leis da necessidade, o guerreiro homérico expressa um desejo ardente de afirmar-se, de demonstrar o seu valor, de alcançar a glória que os poetas imortalizaram em seus cantos – isto é, o desejo de atingir a aretê, a excelência. Na Ilíada, Heitor, príncipe troiano, terá de bater-se com Aquiles, mesmo que a derrota e a morte pareçam inevitáveis. Luta não porque seja um insensato a lançar-se precipitadamente a uma batalha nem porque preze o combate, mas porque é um príncipe sujeito a um código de honra e cônscio da sua reputação. No código dos aristocratas-guerreiros, a honra significa mais do que a própria vida.

No mundo aristocrático e guerreiro de Homero, a excelência era interpretada principalmente como bravura e habilidade na batalha. Vemos também a descrição de Homero como o germe de uma concepção mais ampla da excelência humana: a que une o pensamento à ação. Um homem de real valor, diz o sábio Fênix ao remitente Aquiles, é “hábil no falar destro nas ações”. Nesse passo, encontramos a primeira afirmação do ideal de educação grega – a moldagem de um homem que afirma o classicista Werner Jaeger, “uniu a nobreza da ação à nobreza da mente”, que compreendeu “todas as potencialidades humanas”. Desse modo, encontram-se em Homero as origens do humanismo grego, uma preocupação com o homem e suas realizações.

(...) Os homens homéricos demonstram uma considerável independência de ânimo. Os homens tributam respeito aos deuses, mas estes não lhes infundem um temor permanente; escolhem o seu próprio caminho, chegando às vezes a desafiar os deuses. Como afirma o classicista britânico C. M. Bowra, “os autores humanos (...) buscam os seus próprios objetivos e enfrentam os seu próprios reveses; os deuses podem ajuda-los ou frustrá-los, mas o êxito ou fracasso só a eles pertence. Aos deuses cabe a última palavra, mas nesse meio-tempo os homens dão o máximo de si par chegar a glória de merecê-la”.

As obras de Homero são essencialmente uma expressão dda imaginação poética e do pensamento mítico. No entanto, na sua visão da ordem eterna da natureza e na sua concepção do indivíduo em luta pela exclência, estão os fundamentos da maneira de ver grega.

PERRY, Marvin. Civilização Ocidental uma História Concisa. Ed. Martins Fontes. São Paulo .S.P.

A chegada dos dórios (séc. XII a.C.) á circunvizinhanças do mar Egeu constitui momento decisivo na formação do povo e da cultura grega. Na península e nas ilhas – cenário da Grécia em gestação – está instalada a civilização micênica ou aqueana, que desenvolvera em estreita ligação com a civilização cretense e em contato com povos orientais.

A sociedade micênica apresenta-se composta por grande número de famílias principescas, que contribuam para que as cidades-Estados venham a se desenvolver como unidades autônomas, o relevo compartimentando o território, motivo para que desde suas raízes micênicas, a cultura grega se constitua voltada para o mar (via de comunicação e comércio, de intercâmbio e de confronto com outras civilizações, incentivo a aventuras reais e a construções imaginárias.

Chegando em bandos vindos do norte, os dórios dominam a região. Da mesma raiz étnica dos aqueus, apresentavam um “índice civilizatório mais baixo”aqui podemos ter uma discussão interessante sobre o conceito de civilização – porém possuíam uma superioridade: o uso de utensílios e armas de ferro, fator decisivo para a vitória sobre os micênicos, que permaneciam na idade do bronze.

As invasões dóricas acarretam migrações de grupos aqueus, que se transferem para as ilhas e as costas da Ásia Menor e aí fundam colônias, tentando preservar suas tradições e sua organização social de cunho patriarcal e gentílico.
As novas condições de vida das colônias e a nova mentalidade delas decorrente encontram sua primeira expressão através das epopéias: em poesia o homem grego canta o declínio das arcaicas formas de viver e pensar, enquanto prepara o futuro advento da era científica e filosófixa que a Grécia conhecerá a partir do século VI a.C. Posted by Hello

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